1922
- Paulo Leite
- 6 de ago.
- 3 min de leitura

Alguma vez você já se perguntou o que acontece quando a culpa se torna um fantasma que assombra não apenas sua mente, mas também sua realidade? O filme 1922, dirigido por Zak Hilditch e baseado na obra de Stephen King, não apenas explora essa pergunta, mas nos convida a vivenciá-la através dos olhos de Wilfred "Wilf" James. Mais do que um simples suspense de terror, este filme é um mergulho profundo na psique de um homem que comete um ato terrível, e as consequências que o perseguem, de forma visceral e inescapável.

O longa nos apresenta Wilf, interpretado com uma intensidade assombrosa por Thomas Jane. Wilf é um fazendeiro do Nebraska, um homem preso a sua terra, seu modo de vida e suas próprias convicções rígidas. Quando sua esposa, Arlette (uma Molly Parker convincente em seu desespero por liberdade), decide vender a propriedade para se mudar para a cidade, Wilf vê tudo o que ele valoriza ameaçado. A solução que ele encontra para esse dilema é drástica e brutal: convence seu filho adolescente, Henry (Dylan Schmid), a ajudá-lo a assassinar a mãe. O que se segue não é a libertação que Wilf esperava, mas sim o início de seu próprio inferno pessoal, moldado pela culpa e pelo medo.

A atuação de Thomas Jane é o coração pulsante do filme. Ele não apenas interpreta Wilf; ele o incorpora. Vemos a arrogância inicial de um homem que acredita ter a situação sob controle, a fragilidade crescente à medida que sua vida se desintegra e, por fim, a loucura de um homem consumido por seus demônios internos. É uma performance que nos força a sentir a angústia de Wilf, mesmo que repudiemos suas ações. Molly Parker, por sua vez, entrega uma Arlette que, apesar de breve em cena, deixa uma marca indelével. Sua ânsia por uma vida diferente é o motor da tragédia, tornando-a uma figura trágica e complexa.

Zak Hilditch nos conduz pela história com uma direção certeira. A fotografia do filme é essencial para criar a atmosfera sufocante. O cenário rural do Nebraska, com seus campos áridos e casas isoladas, é capturado de uma forma que o torna um personagem por si só, um lugar de beleza melancólica que se transforma em uma paisagem de pesadelos. A paleta de cores é predominantemente terrosa e sombria, refletindo a deterioração da vida e da sanidade de Wilf. A trilha sonora, discreta e perturbadora, é usada de forma inteligente para acentuar a tensão e o sentimento de isolamento, com sons que parecem vir de dentro da própria mente perturbada do protagonista.

A grande sacada de 1922 é que o terror não vem de sustos fáceis ou monstros sobrenaturais. Ele brota da mente de um homem. A proposta do filme é explorar a ideia de que o maior castigo para um crime não é a prisão, mas sim a tortura psicológica que a culpa impõe. A cada rato que aparece na tela, a cada ruído estranho ou visão macabra, entendemos que não estamos vendo fantasmas literais, mas a manifestação física do que Wilf carrega em sua consciência. A insistência do filme em manter o foco quase que inteiramente na deterioração psicológica de Wilf pode ser um desafio para quem busca um ritmo mais acelerado, mas é exatamente essa a intenção.

O ritmo lento e opressor nos coloca na pele de Wilf, nos fazendo sentir a passagem do tempo e o peso esmagador de suas ações. O filme é um estudo de personagem, e cada momento serve para aprofundar nossa compreensão do abismo em que ele se encontra.

1922 é um filme para quem aprecia um drama psicológico intenso, para aqueles que se fascinam pela complexidade da mente humana e as consequências de nossas escolhas mais sombrias. Se você está em busca de um terror que não dependa de artifícios baratos, mas que te assombre muito depois de a tela escurecer, então este filme é uma escolha excelente. É uma experiência cinematográfica que comprova que, às vezes, os piores monstros são aqueles que criamos dentro de nós mesmos.